terça-feira, 30 de junho de 2009

I GOT THE SUCKER


Na minha ingenuidade, pensei durante muito tempo que fossem drosófilas. Mas não: as moscas que às vezes mato são apenas as primas mal-educadas, as que comem o fruto proibido. As drosófilas, e isto se ainda houver drosófilas desde que elas se tornaram um dos brinquedos mais apetecidos da ciência, comem o fruto podre e por terra, já depois do pecado.

Enfim, drosófilas ou não, o facto é que são lentas como eu, atordoadas no seu amor à fruta, as moscas que, impune e arrependidissimamente, costumo assassinar.

Na minha maldade de criança, cheguei a coreografar com prazer o baile moribundo dos bichos que nos roubavam o ar da casa. Enorme, o poder que eu tinha... Está a fazer dez anos, sob a maior catástrofe que a vida me trouxe, perdi a cabeça duas ou três vezes com o Barbas, o meu querido companheiro canino; claro que não o matei, mas matamoscas que era e sou o maltratei – e todos os mimos que hoje tenho para ele não compensam o mal que um dia lhe fiz. Desmedido, o poder que eu tinha... E ainda há uns sete ou oito anos, já bem graúdo e sob os gritos de terror, ou nojo, sei lá, da minha companheira de então, despejei um insecticida inteiro sobre um moscardo atrevido, para depois descarregar o autoclismo sobre o seu corpo ainda em soluços. Desgovernado, o poder que eu tinha...

Compreendo, pois, o assassino: quem sou eu? Apesar de cada vez menos sacrifícios me sentarem à mesa, também eu fui e sou um assassino. Mas não acredito que Obama se possa vangloriar de o ser. Estaria nervoso, apenas isso, por tantas testemunhas terem assistido ao crime.

«I got the sucker»?

sábado, 20 de junho de 2009

mal menor

Se me perco em te não tendo
e de contrário me perco,
que me perca em te perdendo
e te imagine por perto.

Se estas sombras me ensombram
sobre meandros em viagem,
que do horizonte me escondam
e das margens me desquadrem.

Se por cinzas de quem era
mais não quero que ser nada,
que de toda a minha terra
se erga toda a nossa casa.

sábado, 13 de junho de 2009

ciência

Tu já sabias da cerveja
em minimédias delitradas,
dos mortos que eu não choro à mesa
e dos três cães no ar da casa;

das ripas que sobre tijolos
afagam esperas e mentiras,
do sonho largo rente ao solo,
do ocaso ao nascer dos meus dias.

Só não sabias de quão tantas
se tornariam tantas tardes,
que ali nascia esta esperança
que tão mal cabe no que sabes.