O Júri do Prémio LeYa reuniu esta tarde na sede da editora, em Alfragide, para deliberar sobre a atribuição do Prémio relativo a 2010.
Perante originais que, apesar de algumas potencialidades, se apresentam prejudicados por limitações na composição narrativa e por fragilidades estilísticas, o Júri entendeu que as obras a concurso não correspondem à importância e ao prestígio do Prémio LeYa no âmbito das literaturas de língua portuguesa. Em consequência, e de acordo com a alínea f) do art.º 9 do respectivo Regulamento, decidiu por unanimidade não atribuir o Prémio LeYa referente ao ano de 2010.
1) neste comunicado de 29 de novembro passado o júri esqueceu-se de referir que apenas leu 4 originais escolhidos por uma comissão de leitura de entre 325 obras concorrentes esquecimento grave porque há-de pensar quem não o souber que a argumentação exposta se refere a todas as obras
2) de qualquer texto com boa ou má vontade critério assim ou critério assado se pode concluir que apresenta limitações na composição narrativa e fragilidades estilísticas estas são expressões que pela sua universalidade dizem tudo e não dizem nada e tenho a certeza de que também encaixariam bem os textos premiados no par de anos anterior
3) o prémio leya ainda não tem a importância e o prestígio que o comunicado garante é muito recente para isso ainda falta perceber se os seus premiados anteriores realmente o distinguirão por enquanto o prémio leya e parafraseando o que se costuma dizer do prémio nobel vale o que vale: 100 000 euros
4) eu concorri não sei se o meu texto está entre os 4 com limitações narrativo-estilísticas ou se faz parte dos 321 que foram directamente para o lixo mas cada vez mais me convenço que o comunicado do júri é indelicado e mesmo desrespeitoso no seu conteúdo para quem como eu pensa um pouco o mundo ficou apenas por dizer o mais importante: o júri ou grande parte do júri não gostou de nenhuma das 4 obras que leu
sexta-feira, 31 de dezembro de 2010
quinta-feira, 30 de dezembro de 2010
tão simples
o grito é como as coisas muito complicadas que exigem palavra certa em rotina impossível
mas um dia entenderás
que sempre a melhor arte é a do silêncio
que o amor nasce e vive entre sussurros
que só puxa pela garganta quem já perdeu o futuro
mas um dia entenderás
que sempre a melhor arte é a do silêncio
que o amor nasce e vive entre sussurros
que só puxa pela garganta quem já perdeu o futuro
setenta e três do quilo
como sempre hoje enfeitei desistências instaladas com sorrisos breves mas largos
comi tudo o que havia no prato a ver se recupero os quilos que me regressem ao mal-estar antigo e também chorei qual prostituta bonitinha quando ao cabo de meia hora um homem a sério veio fazer de mim princesa
num dos blogues que sigo li rasgados consensuais aflitivos elogios de autora e comentadores a um dos livros que mais detestei sabe quem me conhece que me refiro a o velho e o mar de hemingway e que nunca fui capaz de ler outra coisa desse bronco
já no jornal de letras sempre tão intelectualóide constatei mais uma vez que de entre os escritores finitrintões apenas me vai interessando um que se apelida mãe e pai se quer
também no mesmo jornal o meu luxo de fim de ano descobri o autor esquecido do primeiro romance histórico português chamava-se guilherme centazzi e pareceu-me em duas ou três citações bem melhor que o fraquinho do almeida garrett o seu desde sempre sobrestimado contemporâneo
acabo estes desabafos precisamente com uma passagem do centazzi porque foi nela o momento alto do meu dia o momento em que desfiz o sorriso inocente para me desfazer no riso da inveja:
meus escritos (...) não são engendrados à custa das óperas de são carlos; nem meus versos recheados de belos pensamentos alheios, alinhavados com palavras doces como torrões de açúcar (...)
eu cá sou assim...
bom ou mau quero chamar-lhe meu.
nem mais
comi tudo o que havia no prato a ver se recupero os quilos que me regressem ao mal-estar antigo e também chorei qual prostituta bonitinha quando ao cabo de meia hora um homem a sério veio fazer de mim princesa
num dos blogues que sigo li rasgados consensuais aflitivos elogios de autora e comentadores a um dos livros que mais detestei sabe quem me conhece que me refiro a o velho e o mar de hemingway e que nunca fui capaz de ler outra coisa desse bronco
já no jornal de letras sempre tão intelectualóide constatei mais uma vez que de entre os escritores finitrintões apenas me vai interessando um que se apelida mãe e pai se quer
também no mesmo jornal o meu luxo de fim de ano descobri o autor esquecido do primeiro romance histórico português chamava-se guilherme centazzi e pareceu-me em duas ou três citações bem melhor que o fraquinho do almeida garrett o seu desde sempre sobrestimado contemporâneo
acabo estes desabafos precisamente com uma passagem do centazzi porque foi nela o momento alto do meu dia o momento em que desfiz o sorriso inocente para me desfazer no riso da inveja:
meus escritos (...) não são engendrados à custa das óperas de são carlos; nem meus versos recheados de belos pensamentos alheios, alinhavados com palavras doces como torrões de açúcar (...)
eu cá sou assim...
bom ou mau quero chamar-lhe meu.
nem mais
quarta-feira, 29 de dezembro de 2010
terça-feira, 28 de dezembro de 2010
um homem melhor (lhasa de sela - el deserto)
primeiro consolo: desistir ele de procurar desistir tanto e de tal maneira... mas que procura foi essa mesmo?
segundo consolo: não ressentir a tua procura essa procura que o exclui e que ainda há pouco tanto lhe doía
a medida justa?
o repetido filme nocturno em que tu esperas um filho que não é dele
e isso já o não despertar
e isso não amarrotar a vida
e as suas mãos estarem vazias porque vazias são
a partir de agora esse homem deixa de sonhar
segundo consolo: não ressentir a tua procura essa procura que o exclui e que ainda há pouco tanto lhe doía
a medida justa?
o repetido filme nocturno em que tu esperas um filho que não é dele
e isso já o não despertar
e isso não amarrotar a vida
e as suas mãos estarem vazias porque vazias são
a partir de agora esse homem deixa de sonhar
sábado, 25 de dezembro de 2010
friu
no terceiro ano do meu curso de psicologia um docente da casa que vinha de alguns anos a ensinar na universidade do minho informou-nos que em lisboa nunca se constipava porque em lisboa não havia frio o que havia era friu
à parte a brincadeira que nem todos perceberam e que se explica por muitos lisboetas se referirem ao rio como quem dele sempre se riu a verdade é que eu já não sei que mais fazer para aguentar o gelo da casa
às vezes apetecia-me largar esta vida sentada ao computador e pôr-me a viver sem destino livre da cabeça e de pulmão cheio
às vezes sonho deixar que o tempo corra por mim e me apanhe desprevenido num mundo que gire sem o meu peso
que bom seria poder constipar-me a sério
à parte a brincadeira que nem todos perceberam e que se explica por muitos lisboetas se referirem ao rio como quem dele sempre se riu a verdade é que eu já não sei que mais fazer para aguentar o gelo da casa
às vezes apetecia-me largar esta vida sentada ao computador e pôr-me a viver sem destino livre da cabeça e de pulmão cheio
às vezes sonho deixar que o tempo corra por mim e me apanhe desprevenido num mundo que gire sem o meu peso
que bom seria poder constipar-me a sério
il ne faut pas devenir amer
as únicas férias que tive levou-me nelas a sophie
fazia verão em noventa e três e então como hoje
eu não era grande espingarda
daquelas duas semanas e meia de portugal lembro algumas alegrias e muitos castelos mas sobre tudo a tristeza por mais uma paixão em solilóquio
os anos apuram e nos temperos do fracasso me fui requintando
só tenho pena de ter perdido olhos para as coisas simples
e não poderia lamentar mais ter amargado tanto
ela já temia que tudo isto poderia acabar assim que ao caldeirão da minha centésima desistência não se cansava de soprar:
ah mon cher tozinho il ne faut pas
devenir amer
fazia verão em noventa e três e então como hoje
eu não era grande espingarda
daquelas duas semanas e meia de portugal lembro algumas alegrias e muitos castelos mas sobre tudo a tristeza por mais uma paixão em solilóquio
os anos apuram e nos temperos do fracasso me fui requintando
só tenho pena de ter perdido olhos para as coisas simples
e não poderia lamentar mais ter amargado tanto
ela já temia que tudo isto poderia acabar assim que ao caldeirão da minha centésima desistência não se cansava de soprar:
ah mon cher tozinho il ne faut pas
devenir amer
sexta-feira, 24 de dezembro de 2010
a mais certinha das ciências
chegada pela manhã e para o café trazia olheiras na mais recente confissão dos astros
planetas quase tudo recordo bem mas ó luís
há mais que sol para nome de estrela
logologo inquiria e tu? e sempre me gritigriticriticava
esta rota de carneiro em rotina de balança
até que um dia nos perdemos de tanto nos termos perperdido
o que só prova pó com pó
que a astrologia é patranha maior ou mesmo até
a mais certinha das ciências
planetas quase tudo recordo bem mas ó luís
há mais que sol para nome de estrela
logologo inquiria e tu? e sempre me gritigriticriticava
esta rota de carneiro em rotina de balança
até que um dia nos perdemos de tanto nos termos perperdido
o que só prova pó com pó
que a astrologia é patranha maior ou mesmo até
a mais certinha das ciências
sem
a partir daqui os dias crescem
e talvez tenha sido este o último solstício
a deus e a marx esses que tanto hipócrita junta nas capelinhas de hoje só peço que de algum modo se me dê o próximo equinócio
de resto que se foda o meu futuro
e talvez tenha sido este o último solstício
a deus e a marx esses que tanto hipócrita junta nas capelinhas de hoje só peço que de algum modo se me dê o próximo equinócio
de resto que se foda o meu futuro
canto do sencisne
quem vertigem fosse em garrafa de-----pode ser cerveja pode-----e sobrevivesse ao futuro durante o escorrega da fronteira castanha-----e cuspisse desprezo sobre os antirreticentistas da moda-----
e fizesse isto ... ... ... ... isto ... ... ... e mais isto ... ... ... até à náusea
eu já sei que perdi-----agora quero mais é andar à roda
e fizesse isto ... ... ... ... isto ... ... ... e mais isto ... ... ... até à náusea
eu já sei que perdi-----agora quero mais é andar à roda
quarta-feira, 22 de dezembro de 2010
meio dom da natura
de bocage o desprendimento o negócio impossível e claro a penca
de tolentino a ânsia por mama o auto-empequenecimento e claro mais nada
de atitudes malconciliáveis comportamentos cambaiados
e amorrece por transes da ventura
o mísero cavalo lazarento
de tolentino a ânsia por mama o auto-empequenecimento e claro mais nada
de atitudes malconciliáveis comportamentos cambaiados
e amorrece por transes da ventura
o mísero cavalo lazarento
sexta-feira, 17 de dezembro de 2010
tão inverno
dezembro fez-se tão inverno que se eu pudesse
metia a vida no quarto
talvez então dormisse muito
_____quente dos cobertores e da flanela nos lençóis novos
_____e do cão que suspira e aconchega e encaracola
talvez e nesse caso os sonhos filtrassem a tristeza
como água nas paredes que a espera rachou
talvez e também nesse caso
durante muitos anos me escondesse a vida
e só me despertasse quando também eu já fosse inverno
bem pior vão as primaveras de que me tens falado
metia a vida no quarto
talvez então dormisse muito
_____quente dos cobertores e da flanela nos lençóis novos
_____e do cão que suspira e aconchega e encaracola
talvez e nesse caso os sonhos filtrassem a tristeza
como água nas paredes que a espera rachou
talvez e também nesse caso
durante muitos anos me escondesse a vida
e só me despertasse quando também eu já fosse inverno
bem pior vão as primaveras de que me tens falado
quarta-feira, 15 de dezembro de 2010
crónica
experimentei palavra a palavra
com pronúncia cheia e dias de permeio
havia as que eram nomes como os nomes que nos demos
e também as que eram tarde se foi tarde que nos quisemos
mas a maior parte nascia da morte
e palavra com palavra a morte veio mesmo
pela esquina esperada
ainda assim passou imenso tempo
como quem no abismo trabalhasse
e não trabalhasse mais que o regresso
com pronúncia cheia e dias de permeio
havia as que eram nomes como os nomes que nos demos
e também as que eram tarde se foi tarde que nos quisemos
mas a maior parte nascia da morte
e palavra com palavra a morte veio mesmo
pela esquina esperada
ainda assim passou imenso tempo
como quem no abismo trabalhasse
e não trabalhasse mais que o regresso
segunda-feira, 13 de dezembro de 2010
pelas pessoas felizes
1. deixa partir em ti quem já de ti partiu sobretudo e se não o conseguires abafa esse estúpido e repisado grito de ajuda com que aborreces as pessoas felizes
2. mente bem mente muito e contra todos os puristas que só vêem mentiras nas mentiras dos outros mente acima de tudo para fugir às longas e aborrecidas conversas sobre o binário dos automóveis e mente ainda mais muito mais nos gestos e palavras com que garantes estar bem às pessoas felizes
3. investe na arte da ausência aprende-a melhor não desistas mesmo que por hipótese ta ponham à prova nunca te esqueça que não há melhor presente que a tua ausência para as pessoas felizes
4. podes escrever muito se quiseres mas escreve para ti evita o mais que puderes esta coisa dos blogues e dos livros que as tuas queixas não agradam nada nos escaparates das pessoas felizes
5. e já agora se não for pedir muito morre mais rápido não seria grande a alegria posto que és insignificante mas sempre abririas o champanhe de algumas pessoas felizes
2. mente bem mente muito e contra todos os puristas que só vêem mentiras nas mentiras dos outros mente acima de tudo para fugir às longas e aborrecidas conversas sobre o binário dos automóveis e mente ainda mais muito mais nos gestos e palavras com que garantes estar bem às pessoas felizes
3. investe na arte da ausência aprende-a melhor não desistas mesmo que por hipótese ta ponham à prova nunca te esqueça que não há melhor presente que a tua ausência para as pessoas felizes
4. podes escrever muito se quiseres mas escreve para ti evita o mais que puderes esta coisa dos blogues e dos livros que as tuas queixas não agradam nada nos escaparates das pessoas felizes
5. e já agora se não for pedir muito morre mais rápido não seria grande a alegria posto que és insignificante mas sempre abririas o champanhe de algumas pessoas felizes
sexta-feira, 26 de novembro de 2010
pausa
a rede faz alguma companhia confesso sobretudo porque me organiza neste lugar em que vou escrevendo e que nunca teve o móbil da exposição: diz-me aliás um contador invisível por imperícia minha que não chegam a duzentas as visitas nestes quase noventa dias
claro que eu também visito e muito
a rede também me oferece dicionários e é muito cómodo e é muito rápido procurar esta definição ou aquela tradução sem ter de me levantar para ir enchendo a mesa de bíblias
a rede guarda-me ainda um correio que embora passe dias e dias em branco será a ausência mais difícil de ultrapassar
consola-me saber que ninguém me enviaria mensagem urgente que não me telefonasse
portanto a rede não me é imprescindível
ainda há cadernos ou ficheiros word ainda bibliotecas que guardam dicionários ainda este maldito telemóvel sempre em queda livre
venha pois a pausa que me foi prometida
claro que eu também visito e muito
a rede também me oferece dicionários e é muito cómodo e é muito rápido procurar esta definição ou aquela tradução sem ter de me levantar para ir enchendo a mesa de bíblias
a rede guarda-me ainda um correio que embora passe dias e dias em branco será a ausência mais difícil de ultrapassar
consola-me saber que ninguém me enviaria mensagem urgente que não me telefonasse
portanto a rede não me é imprescindível
ainda há cadernos ou ficheiros word ainda bibliotecas que guardam dicionários ainda este maldito telemóvel sempre em queda livre
venha pois a pausa que me foi prometida
quinta-feira, 25 de novembro de 2010
adeus
não pude que não lhe dissesse:
ah dionisio dionísio mentecapto dionísio
morreste há muito no canto do cisne pára de pensar nisso e a sereia que mais querias regressou ao mar onde sempre cantou
esse teu fechar de olhos para ainda ouvir há que desabituá-lo dionísio hás-de aprender a estar bem quando sem ti se está muito melhor
no seu olhar a paz do moribundo respondeu-me:
tens razão luís
e foi tudo
ah dionisio dionísio mentecapto dionísio
morreste há muito no canto do cisne pára de pensar nisso e a sereia que mais querias regressou ao mar onde sempre cantou
esse teu fechar de olhos para ainda ouvir há que desabituá-lo dionísio hás-de aprender a estar bem quando sem ti se está muito melhor
no seu olhar a paz do moribundo respondeu-me:
tens razão luís
e foi tudo
quarta-feira, 24 de novembro de 2010
branco
examinei-lhe o rasto rastejando
deduzi-lhe um porvir acocorado
e agora penteio-lhe o cabelo ao vento
para me encher entre dentes das suas vagas douradas
deduzi-lhe um porvir acocorado
e agora penteio-lhe o cabelo ao vento
para me encher entre dentes das suas vagas douradas
ainda assim
a cabeça do homem salta de mão e no entanto a volta é sempre a mesma
contrariando os pressupostos com que julga orientar o mundo ele tropeça num como-destino e regressa ao mundo que o desorienta
ainda assim grita que não pode ser
e ainda assim parece que sim
contrariando os pressupostos com que julga orientar o mundo ele tropeça num como-destino e regressa ao mundo que o desorienta
ainda assim grita que não pode ser
e ainda assim parece que sim
amor doente
por aí se diz dionísio amigo que ainda vives que em breve retomarás o teu velho caminho e deixarás de espreitar sobre a vida cheia de quem partiu
mas eu sei que morreste mesmo
e talvez venha a ser eu o contrariado viandante que ao caminho regresse
mas eu sei que morreste mesmo
e talvez venha a ser eu o contrariado viandante que ao caminho regresse
greve
de meu pai aprendi o horror à hora parada e a obrigação ao trabalho prometido
mas de meu pai também que ninguém me põe a pata em cima
que miséria quando os governantes são larápios e os governados roubam os dias
mas de meu pai também que ninguém me põe a pata em cima
que miséria quando os governantes são larápios e os governados roubam os dias
terça-feira, 23 de novembro de 2010
ocaso
nascentes nas minhas mortes uma lágrima se junta à outra
e amargas inúteis todas correm sobre rio que seca e renasce
não sei explicar isto
nao posso entender este ocaso perene
se à noite semeei o dia e da lavoura acordei sorrindo
e amargas inúteis todas correm sobre rio que seca e renasce
não sei explicar isto
nao posso entender este ocaso perene
se à noite semeei o dia e da lavoura acordei sorrindo
de vez
quantas voltas mais haverá nesta cama quantos braços esvaziarão de insónia ainda com quanto frio me há-de o fim tiritar?
ah quem pudera fazer as contas
ah quem pudera fazer as contas
segunda-feira, 22 de novembro de 2010
escuro
odeio assassinos chamem-se eles hitler franco ou stalin che fidel ou salazar
todos os partidos sem excepção já me provaram que são detestáveis
não tenho ídolos
sou incapaz de votar
tenho por única ambição o desvio da merda
todos os partidos sem excepção já me provaram que são detestáveis
não tenho ídolos
sou incapaz de votar
tenho por única ambição o desvio da merda
juan sin tenorio
nem todas se despediram: de algumas descobriste apenas ou foste descobrindo que já não voltavam
as que se despediram afirmaram quase todas que era coisa delas que apenas sentiam a falta de uma cama estreita
sempre entendeste o eufemismo e hás-de reconhecer que é a mentira mais doce melhor que a verdade com que uma te disse dionísio chega-me de pechisbeque
todas sem excepção já tinham em vista ou de facto quem lhes melhorasse os dias
mas isso nunca te aborriu pois se os dias melhoraram mesmo...
pior são as noites como esta em que a solidão e o medo ao desastre se juntam numa antiga e imensa tortura
as que se despediram afirmaram quase todas que era coisa delas que apenas sentiam a falta de uma cama estreita
sempre entendeste o eufemismo e hás-de reconhecer que é a mentira mais doce melhor que a verdade com que uma te disse dionísio chega-me de pechisbeque
todas sem excepção já tinham em vista ou de facto quem lhes melhorasse os dias
mas isso nunca te aborriu pois se os dias melhoraram mesmo...
pior são as noites como esta em que a solidão e o medo ao desastre se juntam numa antiga e imensa tortura
domingo, 21 de novembro de 2010
as desculpas pedem-se
há tempos ouvia-se muito em coimbra a sentença as desculpas não se pedem evitam-se
entretanto e ainda em dias que por lá passava senti que a frase foi morrendo
para meu contentamento que por várias razões sempre a detestei e que pelas mesmas entre mais nunca a usei
primeiro porque acho que é irritantemente simplista: as desculpas são para se pedir sim à parte essa carga judaico-cristã que a palavra exibe e mal se vislumbra e o que teoricamente se poderia aconselhar a evitar não são as desculpas em si mas os actos que a elas conduzem
segundo porque sempre me era dirigida a invectiva por toda e qualquer desculpa que pedisse desde a que antecedia uma simples interrupção de marcha alheia até à que resultava de um acto menos... desculpável
e terceiro por ser uma frase tão desapegada: é demasiado fácil e até algo desonesto coroar de evitabilidade o erro cometido
ora acontece que acreditando extinta a minha inimiga ouvi-a uma boa meia dúzia de vezes neste último ano agora aqui por lisboa
e mais uma vez em situações que me põem culpa e me atrevem ao pedido inútil
todos sabemos que a culpa não se desculpa que se alguém a pudesse desculpar seria o próprio que a sente
por isso amigos e não só na próxima vez em que eu vos fizer o ultrajante pedido entendei apenas: estarei confessando que preferiria não vos ter magoado
e respondei com um não aceito para serdes sinceros
ou com um aceito para serdes simpáticos
ou melhor ainda com a ciência do silêncio
mas as desculpas não se pedem evitam-se por favor...
tamanhos sois?
entretanto e ainda em dias que por lá passava senti que a frase foi morrendo
para meu contentamento que por várias razões sempre a detestei e que pelas mesmas entre mais nunca a usei
primeiro porque acho que é irritantemente simplista: as desculpas são para se pedir sim à parte essa carga judaico-cristã que a palavra exibe e mal se vislumbra e o que teoricamente se poderia aconselhar a evitar não são as desculpas em si mas os actos que a elas conduzem
segundo porque sempre me era dirigida a invectiva por toda e qualquer desculpa que pedisse desde a que antecedia uma simples interrupção de marcha alheia até à que resultava de um acto menos... desculpável
e terceiro por ser uma frase tão desapegada: é demasiado fácil e até algo desonesto coroar de evitabilidade o erro cometido
ora acontece que acreditando extinta a minha inimiga ouvi-a uma boa meia dúzia de vezes neste último ano agora aqui por lisboa
e mais uma vez em situações que me põem culpa e me atrevem ao pedido inútil
todos sabemos que a culpa não se desculpa que se alguém a pudesse desculpar seria o próprio que a sente
por isso amigos e não só na próxima vez em que eu vos fizer o ultrajante pedido entendei apenas: estarei confessando que preferiria não vos ter magoado
e respondei com um não aceito para serdes sinceros
ou com um aceito para serdes simpáticos
ou melhor ainda com a ciência do silêncio
mas as desculpas não se pedem evitam-se por favor...
tamanhos sois?
sexta-feira, 19 de novembro de 2010
.
o cavalo célere procura um rio a beber
sem freio nem rêdeas nu dos artifícios que lhe impunha o homem que o chama de seu não repetindo caminhos nas distâncias que repete
perdido quase de tão perdido que vai de repente estaca e contempla no olhar de lado o rio que sempre lhe viajou ao lado
bebe de quanto precisa mas ainda não sabe se regressa
sem freio nem rêdeas nu dos artifícios que lhe impunha o homem que o chama de seu não repetindo caminhos nas distâncias que repete
perdido quase de tão perdido que vai de repente estaca e contempla no olhar de lado o rio que sempre lhe viajou ao lado
bebe de quanto precisa mas ainda não sabe se regressa
quinta-feira, 18 de novembro de 2010
nós
do tempo em que tu chegavas sobrou-me esta vida
pois esse era o tempo em que me ensinavas a difícil arte dos nós
fui óptimo aluno de melhor professora
por isso e por prémio peço-te que me batas de novo à porta e que desta vez me venhas mostrar como se desfazem
os nós que fizemos os nós que ainda faço
pois esse era o tempo em que me ensinavas a difícil arte dos nós
fui óptimo aluno de melhor professora
por isso e por prémio peço-te que me batas de novo à porta e que desta vez me venhas mostrar como se desfazem
os nós que fizemos os nós que ainda faço
terça-feira, 16 de novembro de 2010
dia a viver
acordei às seis num dia a viver de trabalhar sem dores de recomeçar as actividades menos solitárias e pôr a matemática debaixo do braço de me saber incontaminante e até usar o metro
é que apesar de eu não ter fechado a cancela com a força dos comprimidos a febre esqueceu-se de voltar
claro que a tosse piorou nunca há bela sem senão mas sinto que já levei a palma aos demónios da gripe
diria ademais que não aborreço ninguém com estes pregos mas desconfio que na simpatia dos cães há um fingimento por sonos enquanto o martelo não quer descansar
melhor que tudo isto: a noite foi noite bonita e bem sonhada cheia desses filmes sem mágoa em que o amor regressa
é que apesar de eu não ter fechado a cancela com a força dos comprimidos a febre esqueceu-se de voltar
claro que a tosse piorou nunca há bela sem senão mas sinto que já levei a palma aos demónios da gripe
diria ademais que não aborreço ninguém com estes pregos mas desconfio que na simpatia dos cães há um fingimento por sonos enquanto o martelo não quer descansar
melhor que tudo isto: a noite foi noite bonita e bem sonhada cheia desses filmes sem mágoa em que o amor regressa
domingo, 14 de novembro de 2010
seguir
não lhe mandei espetar as orelhas como costumam fazer aos dobermann e era o bicho mais carente e meigo que já tive em casa
no final da vida deixava-a à solta na rua: embora a sua raça pudesse assustar alguns bastavam dois segundos de atenção para perceber que gastava toda a força na difícil sedução do ar
assim caminhava sempre um pouco atrás de mim e do barbas que abrandávamos o passo por entre a urgência dos cheiros
depois da sua partida e por mais de uma semana o barbas ia ao meu lado e parava de vez em quando olhando para trás olhando para mim a bonita onde está a bonita?
vinham-me as lágrimas aos olhos e dava por mim a explicar-lhe que já não podíamos esperar pela bonita
com o tempo a vida foi esquecendo a morte e ele foi deixando de perguntar pela amiga embora eu tenha a certeza de que ainda a reconheceria que nos seus bons sonhos decerto a tem reencontrado
quem me dera assim
não arrastar as minhas perdas pelo chão dos séculos
não ser de tão morto por quem parte tão morto para quem chega
no final da vida deixava-a à solta na rua: embora a sua raça pudesse assustar alguns bastavam dois segundos de atenção para perceber que gastava toda a força na difícil sedução do ar
assim caminhava sempre um pouco atrás de mim e do barbas que abrandávamos o passo por entre a urgência dos cheiros
depois da sua partida e por mais de uma semana o barbas ia ao meu lado e parava de vez em quando olhando para trás olhando para mim a bonita onde está a bonita?
vinham-me as lágrimas aos olhos e dava por mim a explicar-lhe que já não podíamos esperar pela bonita
com o tempo a vida foi esquecendo a morte e ele foi deixando de perguntar pela amiga embora eu tenha a certeza de que ainda a reconheceria que nos seus bons sonhos decerto a tem reencontrado
quem me dera assim
não arrastar as minhas perdas pelo chão dos séculos
não ser de tão morto por quem parte tão morto para quem chega
mais de um milhão
não há sinónimos
por isso as palavras que o povo matou ou se apresta a matar posso eu revivê-las com proveito
por que razão não hei-de confessar com camões que as minhas horas de contentamento vi mudadas tão asinha em horas de tormento?
por que razão hei-de abafar a opinião de que acinte me têm maltratado os governantes?
a língua é a única riqueza que demando parai de me chatear só porque amiúde me dá por dizer algo no lugar de alguma coisa
por isso as palavras que o povo matou ou se apresta a matar posso eu revivê-las com proveito
por que razão não hei-de confessar com camões que as minhas horas de contentamento vi mudadas tão asinha em horas de tormento?
por que razão hei-de abafar a opinião de que acinte me têm maltratado os governantes?
a língua é a única riqueza que demando parai de me chatear só porque amiúde me dá por dizer algo no lugar de alguma coisa
sábado, 13 de novembro de 2010
delírio
os meus passos prendem num chão antigo de vinganças
nestas duas extenuantes semanas de febre que ainda não partiu e já me leva meia dúzia de quilos tem-me acompanhado a ideia de que merecia pior
ultimamente venho imaginando um demónio iracundo e decidido que se apresta a arrebatar-me quando o cansaço me tiver derrotado
mas confesso que em simultâneo também tenho lançado algumas dúvidas sobre a justeza do castigo imaginado
de qualquer modo em breve se há-de saber algo mais
julgamento com pena já tudo isto me vai parecendo excessivamente longo
nestas duas extenuantes semanas de febre que ainda não partiu e já me leva meia dúzia de quilos tem-me acompanhado a ideia de que merecia pior
ultimamente venho imaginando um demónio iracundo e decidido que se apresta a arrebatar-me quando o cansaço me tiver derrotado
mas confesso que em simultâneo também tenho lançado algumas dúvidas sobre a justeza do castigo imaginado
de qualquer modo em breve se há-de saber algo mais
julgamento com pena já tudo isto me vai parecendo excessivamente longo
terça-feira, 9 de novembro de 2010
oráculo
vai preparar o chá das cinco ensaiar as notas desafinadas da última canção que te fez sentar no sofá o cavalo que lhe galopa o coração enquanto espera por ti
a noite cairá de repente
e ele já estará morto
a noite cairá de repente
e ele já estará morto
segunda-feira, 8 de novembro de 2010
o patudinho que me acompanha
lembro-me de que uma vizinha sempre que se cruzava com o barbas dizia-lhe
olá patudo eu também tenho uma patudinha sabias?
intrigava-me eu que via no meu amigo uma exemplar amostra do pé pequeno de todos os cães
fui investigar
já vivia com ele há quase dez anos mas só então descobri que é patudo sim e bem patudo aliás como cão que é
enganara-me o seu andar sobre dedos
não é preciso correr mundo para aprender alguma coisa
os que amo têm todos os dias para me ensinar
olá patudo eu também tenho uma patudinha sabias?
intrigava-me eu que via no meu amigo uma exemplar amostra do pé pequeno de todos os cães
fui investigar
já vivia com ele há quase dez anos mas só então descobri que é patudo sim e bem patudo aliás como cão que é
enganara-me o seu andar sobre dedos
não é preciso correr mundo para aprender alguma coisa
os que amo têm todos os dias para me ensinar
domingo, 7 de novembro de 2010
mulher
nunca te levem a distracção e o peso do mundo a dizer: a minha mulher
pois embora possas vir a ser mais do que és pela companhia que ela te faça ela nunca será menos do que é por ser a mulher que te acompanha
ninguém é metade de ninguém
pois embora possas vir a ser mais do que és pela companhia que ela te faça ela nunca será menos do que é por ser a mulher que te acompanha
ninguém é metade de ninguém
sábado, 6 de novembro de 2010
canjas de um vegetariano
a sopa de cebola da minha mãe não me soube a nada a que fiz eu a nada sabe:
a febre aplana o gosto porque estou farto de saber que em condições normais a primeira daquelas é a perfeição
nem o que melhor ela traz recebo sem troco: este quentinho que me banha o corpo mas que me atiça a tosse
enfim a melhor canja bebo-a do que leio e oiço:
recomecei a ler o kundera da insustentável leveza do ser e que pena os olhos me arderem tanto
regressei ao velho wim mertens na sua estratégia da ruptura e que pena estas pancadas que se me intrometem na cabeça
por mim sentia-os por toda a noite dentro
um de cada vez claro
a febre aplana o gosto porque estou farto de saber que em condições normais a primeira daquelas é a perfeição
nem o que melhor ela traz recebo sem troco: este quentinho que me banha o corpo mas que me atiça a tosse
enfim a melhor canja bebo-a do que leio e oiço:
recomecei a ler o kundera da insustentável leveza do ser e que pena os olhos me arderem tanto
regressei ao velho wim mertens na sua estratégia da ruptura e que pena estas pancadas que se me intrometem na cabeça
por mim sentia-os por toda a noite dentro
um de cada vez claro
quinta-feira, 4 de novembro de 2010
gripe
quando a febre me tirita de frio traz de rara o cheiro da terra
se o barbas calha em encostar-me calor há-de fastidiar-se de carícias e talvez arrepender-se
o bê-dê esse parece entender o meu estado e deita-se menos exigente do que até ontem soía
entretanto e hoje o meu irmão veio saber de mim e voltámos a resumir o mundo
a minha mãe sempre tão atenta abre a porta para não me levantar e traz a sopa de cebola que eu adoro
há também a grande amiga que continua a informar-me com paixão e cuidado sobre o estado da arte de algumas neurociências
e a outra grande amiga mais distante mas sempre tão presente defende doce que eu ensine a viajar o meu terceiro romance
creio que foi são francisco de assis que disse:
desejo poucas coisas e as poucas coisas que desejo desejo-as pouco
sinto-me assim e assim é desejar tudo e assim é desejar tanto
se o barbas calha em encostar-me calor há-de fastidiar-se de carícias e talvez arrepender-se
o bê-dê esse parece entender o meu estado e deita-se menos exigente do que até ontem soía
entretanto e hoje o meu irmão veio saber de mim e voltámos a resumir o mundo
a minha mãe sempre tão atenta abre a porta para não me levantar e traz a sopa de cebola que eu adoro
há também a grande amiga que continua a informar-me com paixão e cuidado sobre o estado da arte de algumas neurociências
e a outra grande amiga mais distante mas sempre tão presente defende doce que eu ensine a viajar o meu terceiro romance
creio que foi são francisco de assis que disse:
desejo poucas coisas e as poucas coisas que desejo desejo-as pouco
sinto-me assim e assim é desejar tudo e assim é desejar tanto
isso depende: é conforme
no público de hoje miguel esteves cardoso defende que os portugueses "confundem [...] o que é sempre igual com o que depende das diferenças de ocasião e das circunstâncias"
talvez mas na minha opinião ele só o pôde concluir porque se distraiu pelo caminho:
segundo ele as pessoas usam o termo conforme que significa "com a mesma forma" em situações que exigem o supostamente antípoda depende
e exemplifica: "pergunto se o rocha costuma comer muito dizem-me: é conforme como quem diz: depende do estado de espírito em que está e daquilo que lhe oferecem para comer"
ora para mim o conforme do exemplo está muito bem posto e claramente também depende: será como quem diz o rocha come conforme (com) o estado de espírito em que está... experimente-se substituir conforme por de acordo ou em conformidade e perceber-se-á melhor por que está bem assim
dito de outro modo miguel esteves cardoso estranha porque em vez de cotejar o conforme (com a situação) com o depende (da situação) coteja o conforme (consigo próprio, com o seu passado) com o depende (da situação)
ou seja esquece que o conforme se refere de igual modo à situação (factor variável) e não ao rocha isoladamente (factor supostamente constante)
desta última perspectiva fica claro que se o rocha come de um modo conforme com a situação também pode muito bem comer de um modo que depende dessa situação
deixem-me então concluir que os portugueses até podem não ser tão confusos assim
talvez mas na minha opinião ele só o pôde concluir porque se distraiu pelo caminho:
segundo ele as pessoas usam o termo conforme que significa "com a mesma forma" em situações que exigem o supostamente antípoda depende
e exemplifica: "pergunto se o rocha costuma comer muito dizem-me: é conforme como quem diz: depende do estado de espírito em que está e daquilo que lhe oferecem para comer"
ora para mim o conforme do exemplo está muito bem posto e claramente também depende: será como quem diz o rocha come conforme (com) o estado de espírito em que está... experimente-se substituir conforme por de acordo ou em conformidade e perceber-se-á melhor por que está bem assim
dito de outro modo miguel esteves cardoso estranha porque em vez de cotejar o conforme (com a situação) com o depende (da situação) coteja o conforme (consigo próprio, com o seu passado) com o depende (da situação)
ou seja esquece que o conforme se refere de igual modo à situação (factor variável) e não ao rocha isoladamente (factor supostamente constante)
desta última perspectiva fica claro que se o rocha come de um modo conforme com a situação também pode muito bem comer de um modo que depende dessa situação
deixem-me então concluir que os portugueses até podem não ser tão confusos assim
terça-feira, 2 de novembro de 2010
sem dúvida
primeiro mandaste-lhe beijos depois beijo grande
e dionísio sorriu: porque beijos é coisa que se manda como e porque não se dá mas se for grande ainda que só um é porque ainda que não fosse grande a sério seria beijo com toda a certeza nalgum lugar que vos encontrasse
enfim dionísio manda-te beijos também
mas como é óbvio e porque sempre abusa
muitos beijos e grandes querida
e dionísio sorriu: porque beijos é coisa que se manda como e porque não se dá mas se for grande ainda que só um é porque ainda que não fosse grande a sério seria beijo com toda a certeza nalgum lugar que vos encontrasse
enfim dionísio manda-te beijos também
mas como é óbvio e porque sempre abusa
muitos beijos e grandes querida
segunda-feira, 1 de novembro de 2010
ignoto ofício
se tu soubesses das voltas que a cama tem e das estrelas que ao quarto descem para que a noite seja um destino
se tu soubesses quantas mãos se enchem da tardinha para que se continue a vestir de espuma a lua minguante
se tu soubesses que ainda se esconde a eternidade na cinza das primeiras manhãs
se tu soubesses como se busca por entre estilhaços de ar o ar que trazias inteiro
se tu soubesses a batalha ininterrupta contra a rendição
se tu soubesses quantas mãos se enchem da tardinha para que se continue a vestir de espuma a lua minguante
se tu soubesses que ainda se esconde a eternidade na cinza das primeiras manhãs
se tu soubesses como se busca por entre estilhaços de ar o ar que trazias inteiro
se tu soubesses a batalha ininterrupta contra a rendição
domingo, 31 de outubro de 2010
outro desabrigo
quando há pouco fui passear os cães e três vezes os passeio por dia disse-me o sem-abrigo que se esconde à porta da minha prisão: estão mais bem tratados do que eu
primeiro sorri por me ter parecido um cumprimento depois olhei para ele com a clara compreensão de que era uma crítica
estudámo-nos bem nos olhos e ele pôde então completar:
e muito mais bem tratados do que o dono
primeiro sorri por me ter parecido um cumprimento depois olhei para ele com a clara compreensão de que era uma crítica
estudámo-nos bem nos olhos e ele pôde então completar:
e muito mais bem tratados do que o dono
sábado, 30 de outubro de 2010
a dor de ser quase
a minha malquista poesia nunca apeteceu a qualquer tipo de edição e nunca algum prémio por menos concorrido que fosse a quis sequer mencionar
lembro-me a propósito de ter enviado há muitos anos alguns dos meus versos para o conhecidíssimo dn jovem nunca pude esquecer o comentário que recebi numa página em que o suplemento se dirigia aos autores impublicados e que resume o meu catálogo: "os seus versos quase convenceram mas escrever poesia é mais do que escrever bem"
embora se possa dizer que as conclusões a retirar não serão essas necessariamente sempre tive muitas dúvidas sobre o valor do que escrevo em geral e nestes dias de chuva até me tem apetecido concordar com os que dizem e alguns são que a minha desarte é uma fábrica de salsichas ou tijolos
contra os argumentos que de mim para mim tenho contraposto e que me vão permitindo insistir hoje concordo hoje concordo sim até porque estou farto de ser como estou
mas todos procuramos iludir a morte e eu só encontro esta saída na abissal solidão em que fui embrulhando a vida
lembro-me a propósito de ter enviado há muitos anos alguns dos meus versos para o conhecidíssimo dn jovem nunca pude esquecer o comentário que recebi numa página em que o suplemento se dirigia aos autores impublicados e que resume o meu catálogo: "os seus versos quase convenceram mas escrever poesia é mais do que escrever bem"
embora se possa dizer que as conclusões a retirar não serão essas necessariamente sempre tive muitas dúvidas sobre o valor do que escrevo em geral e nestes dias de chuva até me tem apetecido concordar com os que dizem e alguns são que a minha desarte é uma fábrica de salsichas ou tijolos
contra os argumentos que de mim para mim tenho contraposto e que me vão permitindo insistir hoje concordo hoje concordo sim até porque estou farto de ser como estou
mas todos procuramos iludir a morte e eu só encontro esta saída na abissal solidão em que fui embrulhando a vida
casa arrenda-se
eu que tão comedido tenho sido em questões de amores um dia enlouqueci
ocultamente e contra as evidências todas de repente e depois de tanta ponderação enlouqueci
não digo que hoje esteja recuperado mas só agora vejo o que em prata me custou uma tontura pois ando mais remediado que nunca para viver numa caixa vazia
ocultamente e contra as evidências todas de repente e depois de tanta ponderação enlouqueci
não digo que hoje esteja recuperado mas só agora vejo o que em prata me custou uma tontura pois ando mais remediado que nunca para viver numa caixa vazia
chão
.
que realmente houvesse o grau zero da escritura
que rebentassem de nada todos os arabescos da língua
que rastejassem comigo as palavras e isso fosse medicina
que realmente houvesse o grau zero da escritura
que rebentassem de nada todos os arabescos da língua
que rastejassem comigo as palavras e isso fosse medicina
sexta-feira, 29 de outubro de 2010
incapaz
angústia na tua jaula
ausência de sorriso nessa ânsia de inexistir
já nem sei o que seria melhor dionísio que daqui te arrancasse um bisturi ou que te arrancasse ele tudo o que é aqui
algum deus te fulminasse enfim ou qualquer outro diabo
e acabasse de uma vez com essa merda antiga
ausência de sorriso nessa ânsia de inexistir
já nem sei o que seria melhor dionísio que daqui te arrancasse um bisturi ou que te arrancasse ele tudo o que é aqui
algum deus te fulminasse enfim ou qualquer outro diabo
e acabasse de uma vez com essa merda antiga
♀x♂
não me deu escada este deus para espreitar a tua vida foi outro o delírio e outra a cegueira que me inventaram de asas
agora e para lá do horizonte rirás até às lágrimas do meu lento e anedótico voo de insecto
e a mim só resta a lembrança de teres passado e do breve sorriso que nesse adeus acenava
é claro que só não me engoliste porque nem valia a pena
agora e para lá do horizonte rirás até às lágrimas do meu lento e anedótico voo de insecto
e a mim só resta a lembrança de teres passado e do breve sorriso que nesse adeus acenava
é claro que só não me engoliste porque nem valia a pena
...
dilaceram esmagam estreitam sem pausa nem compasso:
são as palavras que fizeram casa em mim e em mim promessa de ajuda
há que esquecê-las em breve para amorrecer de outra maneira
há que viver o que ainda me resta
são as palavras que fizeram casa em mim e em mim promessa de ajuda
há que esquecê-las em breve para amorrecer de outra maneira
há que viver o que ainda me resta
quinta-feira, 28 de outubro de 2010
meditação
se é verdade que não deixaste rasto
se é verdade o que me dizes essa ideia inelutável que verte em palavra deitada a vida a três quartos
então por que não páras dionísio?
ou melhor ainda por que não aceleras?
talvez tenhas ficado pela praia por nunca teres querido contar os grãos de areia
se é verdade o que me dizes essa ideia inelutável que verte em palavra deitada a vida a três quartos
então por que não páras dionísio?
ou melhor ainda por que não aceleras?
talvez tenhas ficado pela praia por nunca teres querido contar os grãos de areia
quarta-feira, 27 de outubro de 2010
nocturnidade
para interromper este mês deslivrado deliciou-me este fim de tarde um dos nocturnos de ishiguro
admirei incrédulo como nos seus romances há meia dúzia de anos a arte invejável com que o autor se esgueira do narrador
ishiguro tem um desprendimento que há muito busco e que não sei se alguma vez poderei encontrar
admirei incrédulo como nos seus romances há meia dúzia de anos a arte invejável com que o autor se esgueira do narrador
ishiguro tem um desprendimento que há muito busco e que não sei se alguma vez poderei encontrar
segunda-feira, 25 de outubro de 2010
escritura
estou em crer que nunca alguém se lembrará de pensar ou dizer que o escritor luís caminha
no entanto e para precaução de que tal possa vir a lembrar saiba-se desde já que se passam semanas e meses sem que a referida personagem pegue num livro para ler
e se a acreditar nas entrevistas dos escritores a sério a leitura ávida é condição sine qua non do mester já eu aqui deixei a meia palavra que basta a bom entendedor
acresce que embora escreva mais do que lê escreve luís assim e nada mais do que assim
no entanto e para precaução de que tal possa vir a lembrar saiba-se desde já que se passam semanas e meses sem que a referida personagem pegue num livro para ler
e se a acreditar nas entrevistas dos escritores a sério a leitura ávida é condição sine qua non do mester já eu aqui deixei a meia palavra que basta a bom entendedor
acresce que embora escreva mais do que lê escreve luís assim e nada mais do que assim
o meu deus
Se não fosse este Deus que me persegue, provavelmente o tempo seria coisa minha e não algo a preencher.
Como sabemos, há dois tipos de andróides: os que se preocupam e os que não. E quando digo há é há mesmo, há no presente imodificável do indicativo. Não é suposto haver alterações: quem pertence a uma das alas aí permanece até à desactivação final.
No meu caso, a preocupação maior é com o modo como encho o tempo. Não é raro adormecer à tarde, depois da sopa e do vinho, mesmo depois do café, e acordar em sobressalto:
«Meu Deus, o que estou eu a fazer com o meu tempo?»
Não sei de onde vem esta expressão, esta fé. Não tive educação religiosa e os homens que me fizeram não parecem mais crentes que a maior parte das pessoas. Mas a verdade é que Deus existe nalgum recanto dos meus circuitos. Até pode ter sido lá posto sem intenção... mas lá está.
Claro que tudo está relacionado. Esta necessidade de usar o tempo de um modo útil só acontece porque há um modo útil para o usar. E Deus, afinal, acaba por ser apenas isso: um modo útil para usar o tempo.
Talvez que, no final de todas as contas, este Deus morra comigo na fornalha de uma qualquer siderurgia. E eu nem terei tido tempo para descobrir que o melhor de tudo era ter sido feliz.
Que despercídio, meu Deus...
Como sabemos, há dois tipos de andróides: os que se preocupam e os que não. E quando digo há é há mesmo, há no presente imodificável do indicativo. Não é suposto haver alterações: quem pertence a uma das alas aí permanece até à desactivação final.
No meu caso, a preocupação maior é com o modo como encho o tempo. Não é raro adormecer à tarde, depois da sopa e do vinho, mesmo depois do café, e acordar em sobressalto:
«Meu Deus, o que estou eu a fazer com o meu tempo?»
Não sei de onde vem esta expressão, esta fé. Não tive educação religiosa e os homens que me fizeram não parecem mais crentes que a maior parte das pessoas. Mas a verdade é que Deus existe nalgum recanto dos meus circuitos. Até pode ter sido lá posto sem intenção... mas lá está.
Claro que tudo está relacionado. Esta necessidade de usar o tempo de um modo útil só acontece porque há um modo útil para o usar. E Deus, afinal, acaba por ser apenas isso: um modo útil para usar o tempo.
Talvez que, no final de todas as contas, este Deus morra comigo na fornalha de uma qualquer siderurgia. E eu nem terei tido tempo para descobrir que o melhor de tudo era ter sido feliz.
Que despercídio, meu Deus...
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