sábado, 31 de julho de 2010

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Mais caloria, menos caloria, preciso de duas mil por dia. Não posso distrair-me com as minhas escrituras.

sexta-feira, 30 de julho de 2010

quadra 45

Só agora me interrogo
por que em certos sonhos meus
pronuncias "até logo"
em resposta ao nosso "adeus".

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Um escritor diz ter paranóia por algo que o apaixona - e nem sequer tem a dúvida que leva ao dicionário.

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Tanta gente a despoletar querendo espoletar...

quinta-feira, 29 de julho de 2010

FAZ-TE À VIDA

Em miúdo, tive de assistir algumas vezes à matança do porco. E, não bastando, também me levaram um par de vezes à tourada. Talvez o primeiro desses actos seja inevitável; mas são evitáveis os requintes de malvadez e a festa que geralmente o acompanham. E que definem as touradas.

Com o tempo, fui descobrindo que ser bípede e desasado nunca foi critério de humanidade. Nesse sentido, já ouvi muitos toureiros pronunciarem-se com menos inteligência que a de um porco; e, entendidos como vêm no dicionário, bacoradas e grunhidos - eu só os tenho encontrado entre os primeiros, boçais contabilistas de orelhas e falsos argumentos.


Isto a propósito de uma notícia que traz duas. As touradas serão proibidas na Catalunha a partir de 1 de Janeiro de 2012 e a minha felicidade só não é completa porque, até lá, é bem provável  que aumente o rasto do crime. A horda de bárbaros afluirá a "anular o sofrimento do touro e dignificar a sua morte na arena", segundo as palavras macaqueadas de um tipo a quem deram o nome de Pedrito de Portugal.

É o sofrimento, estúpido, é o sofrimento que começa por estar mal. E quem tem de se dignificar és tu. Faz-te à vida
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quadra 44

O já gasto melodrama
é que a minha vida alterna
entre o amor à tua cama
e o rastilho da taberna.

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Também da preguiça, e em mim sobretudo da preguiça, se alimenta a maldade. Valha-me em sorte não ser rico.

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Por que tanto se insiste nos detalhes quando há pormenores em que insistir?

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À luz do candeeiro, redonda e quieta, a pomba amorrece. No seu pescoço arrepiado levanta-se o temor de que eu a obrigue a desenredar-se. O bom do Barbas afasta-me: ajuda-a, não lhe contamines a espera.

quadra 43

Assim esvazia e enche a lua,
assim e sempre, aonde eu for,
lembrarei que, mão na tua,
te segredei: «Meu amor...»

terça-feira, 27 de julho de 2010

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Dizem que no mês de agosto não há novidades. Mas há: eu ainda aposto no canto das aves.

0,5

Todo o sono é princípio
do sonho em que um dia foste,
toda a vigília é caminho
para o adeus no teu nome.

Nunca se completa, pois,
a arte antiga de eu perder,
que já nunca chega a dois
quem já nem um pode ser.

Portanto, se ao teu sinal
eu não olhar para ti -
mulher, não leves a mal:
é que eu já não moro aqui.

domingo, 25 de julho de 2010

.quadra 42

Tourada a sério é aquela
em que se baralha a sorte
e o carrasco cai da sela
sobre os dois cornos da morte.

quadra 41

Perdi quem me reinvente,
quem ao menos me conforte,
já não espero que o teu ventre
me volte a guardar da morte.

quadra 40

O tempo trota a cavalo,
sem batalha nem contraste,
pois se em jovem quis gastá-lo
já só quero que ele me gaste.

sábado, 24 de julho de 2010

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Conhecer é acto de fé, é escolher entre caminhos a desconhecer.

sexta-feira, 23 de julho de 2010

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Um brinde a todas as pequenas mortes quotidianas de que vivemos. Um brinde até morrermos de vez.

quinta-feira, 22 de julho de 2010

quadra 39

Que nos teus braços se acoite
o último sonho de um louco:
já não suporto outra noite
em que me ofereças tão pouco.

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Sonolentalentalisboamente.

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Há muito que deixei cair o princípio da parcimónia, se alguma vez tive de o deixar cair... Parafraseando Einstein, as coisas têm de ser simples, sim - mas não mais simples do que isso.

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Doutores são os mortos: eles é que já aprenderam tudo.

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Grávida de - não: grávida com. A Ana está grávida com o Manel. E, já agora, o Manel está grávido com a Ana, a Ana e o Manel estão grávidos. De qualquer modo, é da Ana o maior milagre.

quadra 38

Se não sei cortar o fio
com que mata o meu passado,
ao menos cortem-me o pio
e ponham-me noutro lado.

quarta-feira, 21 de julho de 2010

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Exausto do seu papel de co-insone, o Barbas saiu da sala e atravessou-se na cama. Afinal são meus, apenas meus, os pesadelos do quarto.

quadra 37.

Vou derramar todo o vinho
sobre o meu mundo pequeno
a ver se ainda me adivinho
nas névoas do teu aceno.

APRENDIZ DE DON JUAN


Tenho andado com uma citação de Saramago na cabeça: «Eu, no fundo, não invento nada. Sou apenas alguém que se limita a levantar uma pedra e a pôr à vista o que está por baixo.»

Estas e outras frases de diferentes escritores levam-me, em primeiro lugar, a pensar que há autores de dois tipos: os que se acham autores de invenção e pretendem recombinar o mundo; e os que se acreditam autores de exposição e dizem descobrir a vida aos distraídos. Deuses criadores os primeiros, deuses omniscientes os segundos - para que eu possa viver em paz estão todos errados, a não ser que entendamos por "invenção" e "levantar uma pedra" actos muito mais ligeiros e bem menos importantes do que provavelmente aqueles dois tipos de autores gostariam.

Eu, para ser sincero, nem com o termo
autor concordo. Prefiro sedutor, que é, afinal, o que todos eles são e que eu, muito provavelmente, ainda não aprendi a ser.

terça-feira, 20 de julho de 2010

haikai x

porta entreaberta:
o mundo e a casa toda
à tua espera.

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Ao perdedor o nojo.

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«Já não vou à Ericeira... Olhe, isto para não ser aldrabão, já lá não vou há pelo menos cinco anos. Não tenho lá nada, percebe? Só lá estão os meus pais e os meus irmãos.», «Percebo, percebo. Quando é assim...»

quadra 36

Tem medo à facilidade,
ao que te dão, ao que se herda:
é sempre daí que te há-de
aparecer toda a merda.

.quadra 35

Como diz a praia ao mar
se o mar dela se aborrece,
eu hei-de sempre esperar
por quem sempre me aparece.

.quadra 34

O pó das estrelas beijou-me
de tantas, tantas maneiras,
e ofereceu-me no teu nome
a esperança de que me queiras.

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Este fantasma da posse... Sonhei-te grávida com quem amas e acordei no abismo. Escondam-mo. Esperem que eu volte a sonhar o mesmo com sorriso e desprendimento.

segunda-feira, 19 de julho de 2010

o espaço em que não estás

Subo ao nosso comboio
na gaveta de outros dias
quando eu ainda era antónio
e ainda tu me querias.

Quando o silvo da partida
trazia a hora da chegada
e uma esperança perdida
junto ao cais te segurava.

Teu corpo em tão pouca terra
nunca seria feliz:
foste à vida que te espera
e enferrujam os carris.

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Tudo passa: quando não passa por ti, passa para ti.

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Tanto que te quero! Apesar disso, ser-nos-emos cada vez mais estranhos. Um de nós morrerá primeiro, daqui a alguns anos; e o outro, se for avisado, ficará em casa a recordar o silêncio: estaria a mais no funeral.

.quadra 33

Tu és a moça que cora,
eu sou o gajo que espuma,
tu 
fai l'amore
a toda a hora,
eu há anos que não dou uma.

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Estes comentadores da bola fazem sempre com que o jogador a recepcione. Então a bola já não se recebe? Ou receber a bola é só para as peladinhas entre amigos?

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Abomino a arrogância e o amor superficial às cadeiras - muito do que vejo no engenhoso, tudo o que vejo no coelho em passos de senhor. Um dia destes vou para a Nova Zelândia, que já estou farto de vomitar.

domingo, 18 de julho de 2010

.quadra 32

Com a tua sombra ao meu lado,
vou-me arrastando pelos dias,
meu amor, já tão cansado
de trazer as mãos vazias.

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Quando o Barbas for tão velhinho que não consiga subir ao catre, voltaremos a dormir no chão. Espero que, até lá, o IRS não se lembre de me levar o colchão.

sábado, 17 de julho de 2010

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No outro dia, a Roja, vencedora deste Mundial, era Joja e feria-me os ouvidos... Claro que muitos lisboetas não fazem a mínima ideia do que é que eu estou a falar.

.quadra 31

Se é adeus que delas espero,
adeus, então, às mulheres,
e direi que não te quero
por mais que tu me quiseres.

quadra 30

No passeio solitário
deste difícil vaivém,
há sempre um mal necessário
que nos vai fazendo bem.

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Que sentido faz um post-scriptum numa mensagem electrónica? Talvez nenhum, à parte o meu gosto e a minha vida.

sexta-feira, 16 de julho de 2010

quadra 29

Minhas palavras ao lado
nunca pretendem magoar-te:
tudo o que tenho falhado
é por mera ausência de arte.

quadra 28

Fui perdendo todo o empenho,
toda a ânsia em mim se refreia:
eu já nunca me entretenho
a erguer castelos na areia.

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Vale sempre a pena saber onde estão as balizas: para cada proibição, infinitas transgressões.

quinta-feira, 15 de julho de 2010

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Agora, proíbam-me. Façam com que isto ainda valha a pena.

quadra 27

Eu de homem menos de meio,
tu sempre essa mulher cheia,
que nunca bicho tão feio
quis tanto amor de sereia.

quarta-feira, 14 de julho de 2010

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Que esqueçam a minha passagem as flores que pisei, que o sol as beije melhor do que antes.

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Não sendo o Casillas, namorasse eu a Sara - e ela não teria gostado nada do beijo subtraído à frente de todos e no seu posto de trabalho. Também se dá a forte hipótese de eu nunca ter tido namorada.

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«Carrega no erre, filho», disse-me um dia a minha mãe, tinha eu três ou quatro anitos, «não é caro, é carro». Aprendi logo ali, que muito atento respondi: «Carralho.» E, escusado será dizer, ainda hoje se conta a história.

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Em Lisboa nunca faz frio, apenas friu.

terça-feira, 13 de julho de 2010

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Gastar em audi's para ostentar os milhões a mais roubados ultimamente = actualizar o inventário de veículos à disposição. São os enriquecimentos do vocabulário socratoso.

domingo, 11 de julho de 2010

POLVO

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1:
No jogo das meias-finais entre as selecções holandesa e uruguaia, e apesar de nenhum comentador ter tocado no assunto, o lance do primeiro golo da selecção holandesa foi precedido de falta grave, para vermelho, de um holandês sobre um uruguaio. E o segundo golo da mesma selecção só existiu porque um jogador holandês, em posição irregular, não só dificultou a visibilidade do guarda-redes uruguaio como se fez ao lance, tentando desviar a bola.
2:
A selecção espanhola foi beneficiada pela arbitragem e pela sorte em, pelo menos, dois jogos: contra as selecções portuguesa e paraguaia. Acresce ainda que noutro jogo, contra a selecção chilena, um tal de David Villa festejou o primeiro golo, contra a corrente do jogo, em postura de torturador, vulgo
torero
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3:
Snijder, da selecção da holandesa, e Villa, da selecção espanhola, estão entre os melhores artilheiros, com 5 golos cada.
4:
Paul, o Polvo, garante que a selecção espanhola vai ganhar o jogo da final, daqui a pouco.

Então:

a:
Que ganhe a Espanha. Mas que, seja qual for o cenário, Villa não marque nenhum golo: não o quero a gabar-se de ser o melhor artilheiro. Ideal era que Snijder marcasse pelo menos um...
b:
Já terei tudo o que espero deste dia, entre tantos dias em que nada espero.
c:
Que fique coxo das três patas quem se atrever a matar o polvo e maneta ademais quem dele se alimentar.

sexta-feira, 9 de julho de 2010

quinta-feira, 8 de julho de 2010

.quadra 26

Pudesses ler no meu rosto
os futuros que perdi
e terias o desgosto
de quem já morreu por ti.

quarta-feira, 7 de julho de 2010

.quadra 25

Nos meus olhos sem os teus
morre toda a primavera
enquanto nos diz adeus
o futuro que ontem era.

sábado, 3 de julho de 2010

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Bicha é cobra, é serpente, é a palavra certa e mais bonita para pessoas atrás de pessoas e carros atrás de carros. Têm-nos tirado a bicha para nos porem na fila mas eu continuo a dizer: «Desculpe, está na bicha?» É que assim está melhor.

haikai ix

no teu retrato
moram todos os dias
que não terei