Sempre gostei dos nacos de prosa de Miguel Esteves Cardoso e embora já quase não compre jornais nunca deixei de espreitar o que ele escreve e fica disponível no Público em rede. E até sorrio daquilo com que discordo. Como há tempos aqui pus, a respeito de uma perplexidade dele relacionada com a expressão "é conforme".
Há dias, uma sua interessante reflexão no Público (A Vida Agendada, 03.01.2014) recordou-me os encantos de escrever com caneta (embora, no meu caso, sempre tenha escrito muito mais rápido no teclado, fossem eles da máquina de escrever ou do pc). Mas o que me chamou mais a atenção foi o modo como acaba o último parágrafo: "Cada vez uso menos o telemóvel e cada vez me sinto mais livre e
contente. E o meu mundo não só não desabou como melhorou
qualitativamente. Já não era sem tempo. Que estranha frase esta última.
Que quererá dizer?"
Não percebo onde está a estranheza da expressão 'Já não era sem tempo' (bem bonita, por sinal). Quer simplesmente dizer que... já não era sem tempo. Nem sequer é um caso de dupla negação, como em 'não há nada' (que costumo evitar escrever porque não gosto). 'Já não era sem tempo' é para ler literalmente. O 'não' nega tudo o que vem a seguir: 'Já não era sem tempo' = 'Já não (era sem tempo)' = 'já era com tempo' = 'já estava a demorar (a acontecer)'.
Como admirador que sou do MEC, estou a pensar ir ao lançamento do seu próximo livro e, entre um olá e o percurso da sua caneta numa dedicatória que eu lhe peça, dizer-lhe contente: "Parabéns, Miguel, por este novo livro. Já não era sem tempo'.
Sem comentários:
Enviar um comentário