terça-feira, 29 de maio de 2007

AMORIGA

-----Metro e oitenta de pele em osso!
-----
O velho ficou desconfiado. Tinha pedido moça de calor fácil e prazer rápido; para quê mandarem-lhe tanta mulher?
-----
– A menina tem a certeza de que é a pessoa indicada? – perguntou, com uma voz submissa, talvez até um pouco assustado.
-----
Ela piscou-lhe o olho e sorriu com um dos cantos da boca. Tinha-se maquilhado para o amor e a sua mãozinha estreita e comprida abraçou a manápula quadrada do velho. Arrastou-os para o quarto.
-----
Havia duas camas de solteiro, separadas por um vazio estreito. Sentaram-se na mais distante e ele decidiu estremecer os lábios ávidos nos corredores daquele pescoço tenro e comprido. Ela sentiu cócegas e ficou toda arrepiada; olhou para o velho com a ternura das almas gémeas; e, enquanto se inventava pequenina, o seu peito pôs-se a subir e a descer.
-----
No quarto de banho, o amor do velho tomava um duche. Fechava os olhos grandes e pestanudos e uma lágrima escapou-se-lhe como no dia em que ele tinha decidido partir. Mas, entretanto, a mulher alta tinha tirado o casaco e deitou-se de lado, levando o velho consigo. Cara com cara, abraçaram-se muito. Os olhos dele brilhavam como um lago raspado pela lua cheia.
-----
Não se viam há mais de trinta anos mas, agora, o amor do velho saía do duche e entrava no quarto.
-----
– Amoriga... – sussurrou ele, quando a viu.
-----
A mulher alta apertou-o mais ainda nos seus braços.
-----
– Amoriga...
-----
A mulher alta disse chhhh... e percorreu com a língua o caracol do seu ouvido. Ele fechou os olhos.
-----
O amor da sua vida percebeu o que se estava a passar. Quando os viu abraçados, fechou o sorriso que trazia e baixou a cabeça. Deitou-se na outra cama, pôs nos olhos um cão com sono. Estava à espera que ele se cansasse e mandasse embora a mulher alta.
-----
O velho, no entanto, tinha parado o seu tempo. A mulher alta, agora nua, procurava o prazer rápido; ele ia-se afastando, demorava a sua própria nudez. De vez em quando olhava para o seu amor e tinha pena do que nunca tinham podido viver. A nostalgia esburacava-lhe os ossos e doía-lhe como as dores frias do reumatismo.
-----
Foi então que o seu amor se levantou.
-----
– Adeus... – disse, em voz distante mas decidida, despedindo-se para sempre.
-----
– Amoriga! – gritou ele, a chorar como uma criança quando se perde. – Oh, amoriga!
-----

-----Acabava de entrar na mulher alta.

Sem comentários:

Enviar um comentário