A voz grave e rouca começou por se engasgar mas depois calou tudo em redor. Impossível dizer de que serviam aqueles volteios, se eram realmente necessários à aproximação do fim; mas de repente a máquina decidiu-se e rodou em linha recta, parando a meia dúzia de metros.
Janelas partidas, um ligeiro desequilíbrio de luz, o copo esquecido em estilhaços no chão... O primeiro embate desenhou na parede da sala um rasgão de alto a baixo, por onde se escoou o pó de um grito.
E agora? Sobre o ruído branco da máquina, dir-se-ia que o silêncio. Mas depois, abafados como ao longe, homens que falam. Parecem prever a localização do próximo golpe. Ou comentarão a violência do primeiro? E BUMMM!
Outro. No mesmo sítio. Um rombo, um fio de água a escorrer na parede em frente. No entanto, a casa continua em pé. Abanada nos seus alicerces, são cinquenta anos de estar ali, é dela a paisagem.
Menos espaçados, sucedem-se os ataques. No exterior a cedência começa com o que parece uma enorme teia de aranha e, por fim, a esfera metálica atravessa a parede como se fosse de papel. Cai uma parte do telhado sobre o chão da cozinha, outra parte mais além sobre a cama abandonada.
Num espirro prolongado, a casa é varrida pela esfera. Nos seus vazios entram em pedaços todas as fronteiras. Um monte de peças soltas forma agora um puzzle impossível e por momentos algumas dessas peças demoram a ajeitar-se, a descobrir o seu lugar entre as outras.
Voz extinta entre soluços, esfera abandonada ao chão, a máquina vela agora um cadáver.
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