sábado, 22 de maio de 2010

CONVERSAS

Há muitos anos, li um antigo provérbio de que desconheço a origem e de que logo esqueci os pormenores. De qualquer modo, guardo na memória o essencial do que aconselhava: de entre os seus pretendentes, uma rapariga deve escolher o melhor conversador; desse modo, estará em boa companhia quando não houver mais nada do que palavras. Não sei que mulheres (e homens...) poderiam, na Antiguidade, ter essa liberdade de escolha; é provável que o provérbio fizesse parte dos parlapiés paternos e raramente fosse tido em conta. À parte estas dúvidas, sempre associei aquele mais nada ao desinteresse sexual.

Mas, embora eu seja mau conversador, nunca nada disto me preocupou. Por um lado, porque fui deixando de prestar atenção à maior parte dos problemas antes de eles o serem; e, por outro, porque também fui percebendo que, muitas vezes, os problemas são bem mais manuseáveis quando chegam à casa certa. Acrescente-se que se vai tornando cada vez mais reduzida a probabilidade de envelhecer acompanhado – e conclua-se que, embora saiba da invenção do Viagra e quejandos, não me vale a pena dedicar ao tema um minuto do meu tempo.

E é neste oceano de sossego que me colhem as últimas notícias, segundo as quais aqueles medicamentos miraculosos estão associados a uma tendência bastante acrescida de surdez. Sendo assim, está decidido: vou transformar em improbabilidade a probablidade reduzida de envelhecer acompanhado – porque, enfim, prefiro viver de amores platónicos e continuar a ouvir conversas, ainda que sejam de outros. Quanto aos que sabem conversar e não querem prescindir de amores a sério, aconselhá-los-ia a aprenderem a ler nos lábios. E a habituarem-se aos discursos sem aplauso.

Sem comentários:

Enviar um comentário