na minha vida quase sem registos cai hoje a fotografia ocasional de um dia há onze anos
foi o ano em que meu pai morreu e também o ano em que deixei de envelhecer pois é de ciência certa que o tempo e a morte não me ocupam desde então
o pêlo ainda sem brancas já escondia o queixo que sempre quis esconder e o olhar sem espera traindo o azul de sempre lembra o de agora sem o peso aferido pela desistência
quanto passei desde então nesta minha vida de agostos por casa e viagens ao café de chapa ganha ao dia e gasta à noite de meia dúzia de amigos que fiz por ir despedindo
não confesso como neruda que vivi apenas e tanto que nesta corrida lenta persistem amizades nunca traídas entre as quais a deste bichinho sempre em busca do meu calor e que me adora por sala e cama a deste cão que me lambe as lágrimas e encosta a cabeça à minha na concha da almofada:
é o velhinho e inestimável barbas comigo desde esse dia há onze anos que a fotografia recorda
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