domingo, 1 de julho de 2012

palavras como aves (1991)

Pensei dar-lhes o nome de rolas
que nas nossas memórias ficasse;
têm a textura das aves em fuga
e o desejo de fuga das aves,
o arrulho das noites em espera,
o aroma impreciso do que há-de.

Porque o amor nesses dias poalhava
de mistérios teu corpo sem dono,
quis mantê-las em conchas de mão,
concebê-las em sonos de sonho,
percorrê-las enquanto houvesse onde,
conhecê-las em quandos de outono.

Mas agora que tudo já sobra,
que faço eu do que nunca foi meu?
Se já nem o meu corpo é de aqui
que palavras serão mais que nada?
Se algum dia houver nós outra vez,
há-de ser em palavras como aves;
pensei dar-lhes o nome de rolas
que nas nossas memórias ficasse.


---------------------------------------------lisboa e 1991

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