Henoch ao seu amor perdido". Modifiquei-a (encurtei-a) em 2006. É o meu texto em prosa mais antigo; pelo
menos dos que foram perdoados pelo pequeno incêndio que destruiu grande parte do que escrevi na minha
juventude.
De trabalhar a terra, nunca mais quis saber. Partiam todas as madrugadas, ele e mais uma dúzia de seguidores, para onde a caça os levasse. E chegavam antes do ocaso, extenuados e, quase sempre, com a tarefa cumprida.
Foi nesses primeiros tempos que, ao fim da noite, quando se acendiam os fogos e se comia, o poeta lhes trouxe o gosto pela música, a ele e à minha mãe, que já se procuravam para outros enredos nos seus sonos. Rasgavam as noites com os instrumentos e as vozes que ainda hoje o vento guarda, dançavam e riam, riam até ao esgotamento.
Não havia noite em que o poeta não trouxesse ideias novas. Afastando a barba enorme, dedilhava, acariciava, golpeava as cordas, enquanto os seus olhos hipnotizadores envolviam e levavam todos num voejar de sons e sonhos. Começou o meu pai, então, a acompanhá-lo com harmoniosa mestria; e, para júbilo de todos, atreveu-se minha mãe na arte das sereias.
Para o poeta, as noites estendiam-se naturalmente ao nascer do sol, para os meus pais até onde lhes era possível. E na ressaca planeava-se a simplicidade dos dias seguintes.
Mais anos que os que tenho se passaram assim, naquele abraço ao fogo que também veio a ser meu. Mas, então, o poeta partiu.
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